Nem sei como começar esse artigo, pode dar “pano para a manga”.

Talvez começar pelo lado mais difícil e dizer que nós, seres humanos somos regidos pelo princípio do prazer e que nós não comandamos nossa vida, quem comanda é o nosso inconsciente.

 Assim já declarou Freud no início do século XX e a verdade perdura até hoje.

Valho-me dessa introdução para justificar o que vem a seguir: a verdade nem sempre é gostosa, geralmente não. Então muitas pessoas preferem ser enganadas, acreditando em soluções rápidas e fáceis como as crianças pequenas que acreditam nas fantasias da Disney, que por sinal andam bem menos fantasiosas atualmente.

Adoramos o lado fácil porque não nos desgasta emocionalmente, é mais simples, mas nem sempre eficaz.

Quem comanda nossa vida e nossas escolhas é o que habita nosso inconsciente, por isso precisamos ver além do que está exposto.

O que quero dizer é sobre o fato da Seleção masculina de Futebol do Brasil viajar para um campeonato altamente competitivo, a COPA DO MUNDO 2022 sem levar um (a) psicólogo (a) ou outro terapeuta da saúde mental na bagagem.

Isso é absolutamente inadmissível visto que é um evento com muita visibilidade, onde há muita competição entre as seleções e uma disputa por visibilidade muito acirrada dentro da própria seleção, onde talentos são medidos e egos inflados e ou feridos que podem dificultar e muito o relacionamento e desempenho dos atletas e da comissão técnica.

Ganha-se muito ou se perde muito numa COPA e não é somente o título, é prestígio que se reverte em dinheiro em contratos milionários em clubes internacionais e em propagandas. Isso aumenta a pressão.

O emocional dos atletas também é altamente abalado devido ao assédio da imprensa mundial, da imprensa do Brasil e das Redes Sociais onde hoje os 220 milhões de “técnicos de futebol” (população brasileira estimada) podem tecer suas críticas e comentários, colocando mais “pimenta na feijoada”.

Por que disse que preferimos ser enganados?

Pelo motivo de que a opção de não levar um profissional habilitado é uma decisão mais fácil, “assim não teremos ninguém de fora nos julgando” ou “o negócio é motivar a turma, não precisamos de um profissional especializado para isso”.

É uma escolha baseada em crenças subjetivas que se abrigam no inconsciente de cada pessoa, não na ciência.

Não sei os motivos que levaram a CBF prescindir desse serviço para os nossos jogadores, mas com certeza frases motivacionais (as que foram afixadas nas paredes da concentração) podem ajudar, mas não resolvem conflitos emocionais tampouco pressão para um ser humano ser infalível.

Na minha opinião como profissional da Psicanálise esses atletas deveriam ter acompanhamento sempre de um profissional da saúde mental para serem sadios do ponto de vista psíquico muito antes do início de uma COPA DO MUNDO.

Mas ainda há muito preconceito para se fazer esse acompanhamento.

O profissional de saúde mental deve sim acompanhar a seleção no período para suporte emocional de um trabalho realizado antes, a longo prazo.

Os atletas do futebol, geralmente, possuem um histórico de vida bem difícil, com privações financeiras e emocionais, inclusive de abandono, como o caso do Richarlyson amplamente divulgado na mídia brasileira.

Como vão segurar a pressão de serem o “salvador do time” da vez? Como vão conviver com eventuais derrotas?  Isso precisa ser previsto num campeonato que vai eliminando os pretendentes ao título.

Eu li que esse jogador o Richarlyson depois da derrota declarou: “foi o golpe mais forte que já sofri”.

Essa frase já demonstra o despreparo emocional que esses rapazes têm para a derrota. A mídia e as frases motivacionais de autoajuda não cogitam a hipótese da derrota, tratam o atleta como um quase deus, infalível. O psicólogo ou outro terapeuta da saúde mental vai trabalhar também e necessariamente com a hipótese da derrota.

Assim é para todas as pessoas, devem ser preparadas para as vitórias e as derrotas em qualquer setor da vida, daí a importância de preparo emocional.

Por fim, a decisão de não levar esse suporte psicológico é no mínimo demonstração de muita arrogância, principalmente para leigos no assunto.

Escrevendo esse artigo soube que o Richarlyson tatuou o rosto do jogador Neymar nas costas, isso é muito explicável do ponto de vista psíquico, mas é assunto para outro dia.

Para saber mais sobre a importância de psicólogos para atletas de alto desempenho, assista o podcast TRIP (Sporty) onde o entrevistado da semana é o atleta olímpico de natação Bruno Factus que fala da importância de sua psicóloga e psicanalista em sua carreira e na superação de uma depressão pós uma derrota olímpica na Olimpíada do Brasil.

É por isso que digo que os seres humanos gostam de se enganar. Vão sempre pelo caminho  que dói menos, como: pensando positivo e com a força da galera nós vamos vencer! “Pra que gastar tempo com preparo psicológico, não precisa”. Viver a ilusão que   se é infalível dá menos trabalho do que preparar-se para uma possível derrota.

A derrota sempre pode acontecer, aliás faz parte do jogo, sobretudo na fase quartas de finais, mas ser derrotado no jogo não é ser derrotado na vida, depende do seu estado psíquico.

Luz Marina Toledo

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